Nesta quinta (7) e sexta-feira (8), o professor da Universidade Católica de Pelotas (UCPel), Ricardo Pinheiro, estará na Fundação para o Desenvolvimento Científico e Tecnológico em Saúde (Fiotec), no Rio de Janeiro, para participar da primeira reunião de análise sobre o andamento da pesquisa “Transtornos neuropsiquiátricos maternos no ciclo gravídico-puerperal: detecção e intervenção precoce e suas consequências na tríade familiar”, financiada pela Fundação Bill & Melinda Gates e pelo Ministério da Saúde, via Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Serão duas manhã de trabalho na etapa chamada de oficina de avaliação, da qual participarão, além do pesquisador da UCPel, outros oito brasileiros que tiveram estudos selecionados pelo programa All Children Thriving (Saúde Para Todas as Crianças), um do mais importantes da entidade internacional.
O procedimento é realizado na Fiotec já que a fundação, por ser um vetor das pesquisas nacionais na área de saúde pública, foi escolhida pela Gates como interlocutora direta e braço operante no Brasil. A análise contará com a presença da pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Claude Pirmez, representante científica da Gates no país, e de dois avaliadores externos. “Eles vão dar um primeiro retorno sobre os pontos positivos e sobre o que acham que temos que adequar”, explica Pinheiro.
Nos dias 12 e 13 de abril, uma comitiva de examinadores já esteve na UCPel para monitorar a evolução do trabalho. Na ocasião, visitaram os laboratórios, acompanharam levantamentos realizados nos bairros e entrevistaram gestantes já selecionadas para participar do estudo.
Atualmente, o estudo está mapeando mulheres na área urbana de Pelotas, com idades entre 15 e 49 anos, no primeiro ou segundo trimestre de gravidez. A pesquisa já identificou 100 grávidas, sendo que a meta é atingir de mil a 1,2 mil no período de um ano. Cinco gestantes já estão recebendo tratamento de depressão e outras 12 para risco de depressão.
A terapia é fornecida na Clínica Psicológica da UCPel, após triagem feita na sequência da aplicação do questionário, quando é realizada coleta de sangue, de peso e altura das futuras mães. Uma vez identificado o transtorno ou o risco, ocorre a visita de uma psicóloga explicando o diagnóstico e convidando a gestante a fazer o acompanhamento, em horário pré-agendado.
“É bastante difícil fazer intervenção terapêutica em gestantes. Elas têm toda uma peculiaridade, que é o seu momento físico e psíquico. Ele produz um processo de retração. A mulher se volta para o feto, se isola”, pontua. Conforme Pinheiro, essas características tornam difícil que a grávida abra a porta, responda ao questionário, deixe colher sangue e, mesmo que se sinta deprimida, vá até o local onde é fornecido o tratamento. “Esta é a preocupação no mundo inteiro, porque as gestantes são um grupo, quando em risco para a depressão ou para outro transtorno mental, que exacerba essa característica e se isola. Então, a grande barreira aqui é localizá-las, convidá-las e sensibilizá-las”, destaca.
Como funciona a pesquisa
O atendimento das grávidas ocorre uma vez por semana. As que têm risco de depressão, ganham seis sessões de acompanhamento, baseado em um modelo cognitivo-comportamental de terapia. As que têm depressão, podem cair em um de dois modelos, o comportamental ou o comportamental-motivacional. “Vários trabalhos mostram que se for feita uma motivação antes, a adesão à terapia é maior e a resposta melhor. Como ainda não foi usado em grávidas, estamos testando as entrevistas motivacionais para ver se são realmente mais efetivas”, explica Pinheiro.
A preocupação da Fundação Bill & Melinda Gates é que, ao final da pesquisa, uma das fórmulas utilizadas pela UCPel sirva como modelo de intervenção a ser aplicado por psicólogos e psiquiatras sem larga experiência, no começo da trajetória profissional. “Se funcionar, queremos que de alguma forma isso possa ser indicado ao sistema de saúde, proporcionando uma reprodução desse modelo, não apenas para o Brasil”, diz.
Foco também na criança
Além do trabalho com as gestantes, o recém-nascido também será acompanhado pela pesquisa nos primeiros meses de vida. No final de julho começam os nascimentos e a equipe que atuará com os bebês já está em treinamento. Além dos marcadores genéticos, serão avaliadas questões motoras, de linguagem e socioemocionais.
De acordo com Pinheiro, intervenções psicoterápicas são efetivas, mas a grande questão do estudo é saber por quanto tempo e em que medida. “Pretendemos descobrir se intervindo na gravidez conseguimos impactar o desenvolvimento da criança. Já temos a ideia que técnicas cognitivo-comportamentais são efetivas para a depressão, mas não na criança. Parte-se do princípio que uma mãe deprimida cronicamente certamente vai alterar o vínculo dela com a criança. Quanto é pela depressão e quanto vem na carga genética? Essas mensurações é que vamos tentar fazer no estudo”, adianta.
Os resultados parciais da pesquisa serão apresentados pela primeira vez entre os dias 22 e 27 de outubro, quando pesquisadores ligados ao Programa Saúde para Todas as Crianças participarão do evento chamado de Grand Challenges, em Londres.
Powered by WPeMatico