UCPel finaliza Censo Nacional de Práticas de Leitura nos Sistemas Prisional e Socioeducativo

Fruto de convênio entre a Universidade Católica de Pelotas (UCPel), o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o Censo Nacional de Práticas de Leitura apresentou seus resultados, após diversos meses de pesquisa.

A equipe formada em boa parte por professores e pesquisadores universitários teve coordenação geral de Christiane Russomano Freire e metodologia de Luiz Antônio Bogo Chies — ambos docentes do Programa de Pós-Graduação em Política Social e Direitos Humanos (PPGPSDH/UCPel).

A Universidade Católica foi a instituição escolhida para coordenar o projeto devido ao reconhecimento nacional e sul-americano do Grupo Interdisciplinar de Trabalho e Estudos Criminais-Penitenciários (Gitep) nas questões relacionadas ao sistema carcerário e às pessoas privadas de liberdade no Brasil – o que, segundo Chies, coordenador do Gitep, demonstra e reforça a seriedade e a maturidade da UCPel em relação ao tema. 

Do censo

Desde 2021, a partir de resolução do CNJ, a leitura é uma das atividades levadas em consideração para a remição de pena da população carcerária. Cada obra lida, tendo a leitura sido comprovada à Justiça, reduzirá em quatro dias a pena da pessoa presa. Esta resolução estabelece o limite de 12 livros lidos por ano, portanto, 48 dias remidos é o teto anual da prática.

Para se ter a certeza de que esse direito à leitura vem sendo efetivado, o censo mapeou todas as unidades de privação de liberdade dos sistemas prisional e socioeducativo do Brasil em busca da consolidação de informações sobre as práticas de leitura destes locais. Dividido em blocos, o estudo identificou e classificou os estabelecimentos de privação de liberdade; mapeou a presença de setores de educação, bibliotecas e espaços de leituras dentro destas unidades; e identificou práticas e projetos de leitura existentes.

O número de pessoas privadas de liberdade, a relação entre cor/raça/etnia, escolaridade, faixa etária, presença de pessoas com deficiência (PCD) e suas situações processuais também foram levadas em consideração.

As populações encarceradas no sistema prisional e internadas no sistema socioeducativo são populações, via de regra, com baixa escolaridade, com baixos ativos culturais, comenta Chies. “Efetivar o direito à cultura, de acesso ao letramento, contribui para que essas pessoas possam ser, pelo menos através destas atividades, atendidas, olhadas”, conclui.

Ao CNJ foi apresentado o diagnóstico obtido através da pesquisa descritiva analítica que entrevistou leitores, profissionais envolvidos com os projetos e gestores do sistema prisional e socioeducativo dos 26 estados e do Distrito Federal. Por questões éticas, os leitores foram entrevistados de forma presencial, destaca Christiane, coordenadora geral do censo.

Resultados

Recém apresentados ao CNJ, os números da pesquisa não foram ainda tornados públicos, mas, em entrevista, Christiane Freire revelou que, tecnicamente, todos os gestores dos sistemas prisional e socioeducativo responderam às questões do censo — um dos maiores destaques do trabalho, pontua, visto que tamanha adesão não é comum.

A coleta de dados gerou uma série de recomendações propostas pela equipe. Este censo subsidiará o CNJ e a Secretaria Nacional de Políticas Penais (SENAPPEN) para a instauração do Plano Nacional de Leitura do sistema prisional e socioeducativo, e, posteriormente, a construção dos Planos Estaduais de Leitura — políticas públicas que garantem o direito à leitura para esses cidadãos que perderam, temporariamente, a sua liberdade.

A literatura como resgate 

Ao parafrasear um dos maiores intelectuais do Brasil, Antonio Candido, a coordenadora geral do censo evidencia a inspiração para todo o trabalho: “o direito à literatura deve ser considerado um direito fundamental”. “Independentemente se a pessoa está privada de liberdade ou não”, complementa.

Além do direito de remição da pena, a prática de leitura promove outros benefícios às populações do sistema penal e socioeducativo. “Existe um resgate de cidadania, do direito à fala, um resgate, inclusive, das relações familiares”, pontua a docente ao esclarecer que existe orientação para que as práticas de leitura envolvam os familiares dos apenados quando possível.

Com o incentivo à leitura, essas pessoas adquirem interesse pelo estudo, têm uma valorização da autoestima, há uma melhora na convivência entre eles e também com os profissionais do sistema. “É, fundamentalmente, para que as pessoas tomem para si sua existência, ‘sou preso, cometi um crime, mas minha vida não acabou’. A literatura permite esse tipo de identificação”, conclui Christiane.

Redação: Caroline Albaini